O CAMINHO DO PRAZER CONSCIENTE
A maioria
das pessoas tem ainda uma idéia de que desenvolver o sexo tântrico
significa nos distanciarmos do prazer e do erotismo. Porém nada poderia
ser mais equivocado do que essa percepção, que já no século XV o mestre
Zen japonês Ikkyu Sojun, cujas idéias e poesia inspiraram o livro Sexo Zen - O caminho da plenitude, de Philip Toshio Sudo.
Aquilo que é hoje conhecido como o Caminho da Penetração nos chega
através do ditado zen “Penetre atraves da forma, depois saia da forma”.
Há diversos sentidos para esse ditado.
Em um desses sentidos, o ditado descreve o caminho da arte. Sempre
que você for fazer alguma coisa nova, seja pintura, culinária ou as
artes do sexo, aprenda primeiro o básico. Você não precisa saber tudo de
uma vez. Comece dando pequenos passos e siga daí. Depois de ter
assimilado as regras de uma forma de arte, você pode “sair da forma” e
criar sua expressão pessoal.
No sexo, muitas pessoas começam atraves da masturbação. Antes de
fazermos sexo com um parceiro, fazemos com nós mesmos. A masturbação nos
introduz aos prazeres do orgasmo e à sensibilidade de nossos órgãos
sexuais. Ela nos prepara para o mundo mais complexo das relações
sexuais. Uma virgem que se masturba é capaz de ter centenas de orgasmos
antes de fazer sexo com um parceiro, e assim pode ficar mais à vontade
sexualmente do que aquela que nunca se masturbou. Para Ikkyu, a
masturbação oferece a mesma oportunidade de revelação que o próprio
sexo.
O que Flui da Essência
Para desenvolver nossa arte na cama podemos recorrer a manuais e
vídeos sobre sexo, a terapêutas especialistas, seguindo a forma dos
outros, experimentando diferentes posições e técnicas. O objetivo,
contudo, é nos tornarmos tão bons nas técnicas que sejamos capazes de
transcender as formas e padrões para fazermos, simplesmente, o que flui
de nossa essência e, por isso, é natural. Esqueça todas as informações,
diz Ikkyu, e concentre-se na essência:
Todos os dias sacerdotes examinam minuciosamente o Dharma (ensinamentos zen).
E entoam incessantemente sutras (ditos) complicados.
Antes de fazerem isso deveriam aprender
A ler cartas de amor enviadas pelo vento e pela chuva,
Pela neve e pela lua.
De forma sucinta, ele diz:
Não hesite, faça sexo, isso é sabedoria.
Ficar sentado entoando, que tolice.
O mundo do corpo.
O corpo possui uma sabedoria própria. Atraves da prática das formas
desenvolvemos esta sabedoria, da mesma maneira que os dançarinos e os
atletas desenvolvem a memória muscular, até o dia em que simplesmente
confiam na sabedoria do corpo e dançam sem pensar. O pensamento só
atrapalha a sabedoria do corpo.
Todos nós nascemos dentro de um corpo e ao longo da vida aprendemos a
usar e a habitar esse corpo, descobrindo o que lhe dá prazer e como ele
se combina com outro corpo. O Caminho da Penetração nos lembra que no
nível mais fundamental, é assim que “penetramos através da forma”: na
forma de um corpo humano. Nós “saimos da forma” quando o corpo morre e
nosso espírito é libertado, ou atraves de uma realização transcendental,
que tanto pode ser uma meditação quanto uma relação sexual com a pessoa
que amamos.
Direto à Fonte
Lembre-se que da mesma maneira que entramos no mundo dentro de um corpo também entramos no mundo atraves
de um corpo, que é o corpo de nossa mãe. A vagina que é penetrada
durante o sexo é a mesma abertura pela qual a vida entra no mundo. O
ponto de entrada, portanto é o ponto de saída e o ponto de todo o
começo.
Deixe que o momento da penetração – quando uma pessoas penetra
fisicamente a outra – leve você de volta a mentalidade de um
principiante no zen e também as origens do seu corpo. Tome cuidado para
não se perder. Atraves do Caminho da Penetração, prossiga direto para a
fonte.
O Caminho da Aceitação
Uma oração popular entre dependentes de drogas que estão em
tratamento é a “Oração da Serenidade”: Deus, dai-me a serenidade para
aceitar as coisas que não posso mudar, a coragem para mudar as coisas
que posso mudar e a sabedoria para saber a diferença.
Há muito de Zen nisso.
O Caminho da Aceitação consiste em aceitar essas coisas que não podem
ser mudadas, não com resignação, mas com alegria. As principais destas
coisas são:
A vida.
Nós mesmos.
Nossos corpos.
O corpo do nosso parceiro.
O que esses corpos se tornarão.
Com dieta, exercícios e cirurgia podemos mudar a aparência do nosso
corpo, mas não podemos mudar o fato de que, enquanto vivermos,
habitaremos esse corpo, e ele vai envelhecer. O Caminho da Aceitação é
conviver com esses fatos, é ser capaz de se olhar no espelho em qualquer
idade e se ver com alegria.
Manifestações da Divindade
O mestre zen Hotei certa vez ensinou este Caminho da Aceitação sem
proferir uma única palavra, usando apenas a sacola de linho que
carregava sempre. Uma pessoa perguntou-lhe: “Qual é o significado do
zen?” Ele deixou cair a sacola ruidosamente como resposta.
A
pessoa continuou: “Então, qual é a realização do zen?” Hotei colocou
novamente a sacola no ombro e seguiu seu caminho. Atraves de sua ação
refinada, a primeira resposta de Hotei significava: “O que é, é.”
Aceite-o. Você deixa cair uma sacola. Primeiro a sacola estava sobre
seu ombro, agora está no chão. O tempo não para. Aquele momento não se
repetirá jamais. A Terra gira em seu eixo e órbita em torno do Sol.
Ficamos mais velhos a cada minuto. E m algum lugar alguém está fazendo
amor. Em outro lugar há pessoas em guerra. Alguém está nascendo, alguém
está morrendo. Todas essas coisa são manifestações da força divina que
energiza o universo. Esta é a verdade subjacente a cada ação e a cada
coisa.
Participando da Vida
A segunda resposta de Hotei nos diz como viver dentro dessa verdade.
Pegue sua sacola e vá cuidar de sua vida. Participe da vida cotidiana.
Muitas pessoas confundem a atitude de aceitação com fatalismo: “O que
será, será. Não há nada que eu possa fazer a respeito”. Este pensamento
nos paralisa. A vida é dinâmica e mutável. Portanto, para nos
ajustarmos completamente a ela, devemos também ser dinâmicos e mutáveis.
O Caminho da Aceitação consiste não em receber a vida como ela se
apresenta, mas em tomar posse dela. Como Hotei, pegue sua sacola e siga
adiante. O que poderia ser mais trivial? No caminho do zen, essa
aceitação representa um milagre: o milagre de estar vivo.
À medida que aprendemos a aceitar a vida como ela se apresenta também
aprendemos o significado de dois conceitos centrais do zen: imperfeição
e impermanência
.
Imperfeição
No pensamento zen, a vida é perfeitamente imperfeita. Como o sexo,
ela é desordenada, complicada, divertida, confusa e, em última
instância, um milagre. Com todas as suas confusões, é assim que a vida
deve ser. Mesmo quando percebemos as imperfeições dos seres humanos,
compreendemos que, num nível divino, tudo é perfeito exatamente do jeito
que é.
Através do sexo zen, trazemos a mesma atitude para os nossos
relacionamentos. As pessoas são do jeito que são. Podemos encorajá-las a
mudar seu comportamento, mas, no final, só elas próprias podem se
modificar. Somos nós que devemos tentar mudar por dentro e aprender a
viver com as “imperfeições” dos outros.
Nossos meios de comunicação nos enchem de imagens de pessoas lindas
com vidas tão maravilhosas que nossa própria vida parece medíocre. Sem a
menor lógica, nos avaliamos e avaliamos as pessoas de quem gostamos com
base em um padrão impossível. Mas os japoneses tem um ditado, Meiba ni
kuse ari: “Até mesmo o cavalo famoso fede. “Você pode ficar imaginando
como sua vida seria melhor se pudesse se casar com uma estrela de cinema
ou dormir com uma supermodelo, mas seus sonhos negam a realidade: mesmo
as pessoas famosas acordam com mau hálito pela manhã e tem seus
problemas na cama
.
A Beleza Inerente
A mente zen sabe como ver a beleza nas imperfeições da vida. Se todas
as coisas nos remetem ao divino, então todas as coisas tem uma beleza
inerente. Ver ou não essa beleza vai depender do nosso nível de
percepção. Se formos capazes de atingir uma harmonia atraves do zen,
poderemos, entender o que os mestres querem dizer com: “É possível
extrair beleza da feiúra.” Penetre na essência de uma coisa e você verá o
esplendor em sua fonte.
A partir do momento em que aprendemos a ver esse esplendor interior,
grande parte da nossa infelicidade desaparece. Somos capazes de superar
as inibições com nossa aparência ou com a de nossos parceiros. Em vez de
pensarmos nas imperfeições, nos sentimos bem na nossa pele.
Reconhecemos que nosso corpo é um mero veículo do espírito e
compreendemos que, apesar de todas as imperfeições da embalagem, a
essência dessa embalagem é perfeita e divina. Não nos identificamos com a
superfície do ser, mas com a energia sexual em seu interior.
Assim sendo, dois amantes imperfeitos fazem um amor perfeito.
Impermanência
Inevitavelmente, o corpo irá morrer. Mas enquanto você estiver
habitando um corpo, viva com alegria. O Caminho da Aceitação não é
aceitar a morte, mas aceitar a vida.
Numa única relação sexual podemos transcender os limites do corpo
físico e perceber a realidade divina no momento presente. O que poderia
fazer uma pessoa se sentir mais viva?
Nosso impulso natural é temer a ameaça da morte de nosso corpo. Os
mestres zen chamam esse medo de “apego ao pó” – o pó material da vida.
Você não levará nada deste mundo material quando morrer, nem seu corpo,
nem seu dinheiro ou suas posses. Tudo se transforma, das cinzas às
cinzas, do pó á pó. Precisamos aprender a aceitar isso e , atraves do
zen, penetrar na verdade maior da nossa existência. Num ensaio
denominado Esqueletos, Ikkyu escreve:
Nós somos esqueletos cobertos de pele, macho e fêmea, e desejamos uns
aos outros. Quando o sopro se extingue, porém, a pele se rompe, o sexo
desaparece e nãi há mais alto ou baixo. Sob a pele da pessoa que tocamos
q acariciamos não há nada agora além de um punhado de ossos. Pense
sobre isso – alto e baixo, jovem e velho, macho e fêmea, todos iguais…
O mundo é assim. Aqueles que não compreendem a impermanência do mundo
ficam pasmos e aterrorizados com essa mudança…Liberte-se da formae
retorne ao território original do ser.
Como o Fogo
Nós nos libertamos da forma através do sexo, usando o corpo para
transcender sua própria impermanência. Conseguimos ver nossa essência
não como o corpo que contém nossa energia sexual, mas com a própria
energia sexual, que é eterna. Nossa essência é como fogo. Muitas vezes
acreditamos erroneamente ser a vela.
No nosso coração sabemos que uma expressão plena do amor, aquela que
emana da fonte da vida, se mantém muito tempo depois que o corpo se foi.
Quando o mestre zen Ryokan expressou seu amor pela monja Teishin, jurou
amor eterno:
Se o teu coração
Permanecer inalterado,
Estaremos unidos tão fortemente
Quanto uma parreira sem fim
Por anos e anos.
Enrosque-se com a pessoa amada como uma parreira sem fim. Aceitem um
ao outro nesse momento e retornem ao território original de seu ser.
Aí se encontra a serenidade.
Aí se encontra o amor.
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